terça-feira, 13 de setembro de 2011

O Meu Menino

Texto de Elifas Andreato



O meu menino representando era, às vezes, tão frágil, tão indefeso, que precisei conter meu desejo de ampará-lo, de lhe prometer proteção incondicional. Em outros momentos, era tão altivo, tão seguro, tão pleno, que parecia de fato estar feliz.


No velório do magnífico Paulo Autran, sentei ao lado do meu irmão caçula e me lembrei de quando ele me disse que queria ser ator. Pensei em como poderia ajudá-lo, pois não tinha nenhuma relação com gente de teatro. Mas ele tinha. Frequentava um grupo amador em Osasco, na Grande São Paulo.

Uma noite o acompanhei para assistir a um espetáculo do qual ele participaria. Para meu espanto, vi o menino que ajudei a criar transformado em um homem que eu desconhecia. Foi a noite em que eu também estreei no teatro.O meu menino representando era, às vezes, tão frágil, tão indefeso, que precisei conter meu desejo de ampará-lo, de lhe prometer proteção incondicional. Em outros momentos, era tão altivo, tão seguro, tão pleno, que parecia de fato estar feliz. Então, contido, suspirei.

Aos meus olhos, acabara de nascer um ator. O meu menino não seria apenas um menino que aprendeu a fingir o que não era, ou o que desejava ser. Era um ator capaz de representar, no limite de suas forças, a beleza e a miséria da condição humana.

Desse dia em diante, o meu menino perseguiu obstinadamente o aperfeiçoamento do seu ofício. E sofreu muito. Por seu sofrimento, chorei em silêncio. Sabia que a dor que dói em um ator o prepara para nos proporcionar o riso.

Tempos depois, o vi em grandes palcos, em companhia de grandes atores, ainda fazendo pequenos papéis. Isso até chegar ao Diário de um Louco, de Gogol – espetáculo solo que me levou às lágrimas e fez minha mãe tentar subir no palco para curá-lo de sua loucura.

Meu menino não parou mais. Hoje é um dos maiores atores do teatro brasileiro, e o invejo por variados motivos. Porém, os mais significativos são ter estado tão perto e ser tão amado por Paulo Autran. E, simplesmente, por ser ator; por viver outras vidas; e por me proporcionar amá-lo em todas elas.

Adeus, Paulo, e obrigado pelo carinho e pelas lições que deu ao meu menino Elias.

Publicado originalmente AQUI.

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